Artigo de Opinião, “Afinal o que nos move?”, por Patrícia Oliveira
Afinal o que nos move?
A cada dia que passa somos confrontados com as mais diversas situações e desafios que nos obrigam a inevitáveis (des)ajustamentos nos quais as nossas fragilidades humanas, pessoais e profissionais, são colocadas à prova, obrigando-nos a lidar com as nossas angústias/ansiedades, emoções e perdas de liberdade.
Não só nossas como dos outros! Afinal somos humanos, mas também psicólogos, e carregamos toda uma história de vida, como qualquer outro ser humano!
A prática profissional exige que sejamos proactivos, responsáveis e profissionais. Surge uma situação de crise e o psicólogo, pelas mais diversas razões, sejam elas reais ou meramente políticas, é chamado a intervir.
E, com as nossas forças e vulnerabilidades, lá vamos nós! A adrenalina e as expectativas face ao cenário que encontraremos começam a apoderar-se do nosso pensamento e do nosso corpo. O espírito de missão, consciência ética e moral, alertam-nos para a eminência de que alguém está em sofrimento e precisa rapidamente de voltar às suas rotinas para dar curso à sua vida e restabelecer o seu equilíbrio biopsicossocial; o saber ser, fazer e estar é revisto em cada gesto, palavra e acção deliberadamente (ou não) realizados no terreno!
Ainda a pandemia COVID-19 começava a dar os primeiros sinais e fomos assolados com medidas, restrições, serviços suspensos. Algumas instituições não querendo deixar de estar na linha da frente e, face ao cariz humanitário que defendem, começaram a ponderar a agilização de ações aos mais diversos níveis. Umas vezes fomos chamados a planificar em conjunto com os órgãos institucionais, outras foi-nos indicado o que teríamos que fazer, e vimos a autonomia profissional uma vez mais esquecida (se é que alguma vez existiu).
Pois bem, é no seguimento de tudo isto que, enquanto psicóloga numa instituição, fui lançada para uma linha telefónica de apoio psicológico! A experiência já me havia alertado que nem sempre é fácil impormos os nossos pontos de vista, já nem me refiro aos pessoais, mas enquanto profissional assumirmos que “se calhar não começamos da melhor maneira e a prestação de um serviço requer rigor ético e deontológico, e mais do que um porque sim” pode ser o mote para conflitos (des)necessários. Porém, o dever profissional impõe-se e o foco no que realmente importa e em quem mais precisa, “obrigam” à prestação de um serviço que cumpra os objetivos para que foi criado e a colocação em primeiro plano da pessoa que está em sofrimento psicológico sobrepõe-se a tudo o resto (nem que seja temporariamente).
Mas não estará na altura de quebrar este temporariamente?! Os últimos meses têm vindo a refletir novas realidades e desafios profissionais, e o colapso de equipas (técnicas e de cuidadores formais e informais) em instituições levam-me ao terreno “da COVID”. Perceber o quão difícil é para os profissionais lidar com os seus anseios e com os das pessoas que carecem dos seus cuidados e, mesmo assim cumprirem horas a fio a sua missão, despertou em mim a clara necessidade de consciencialização para o autocuidado e priorização do Eu, assim como a literacia em saúde mental, a clarificação do papel e funções do psicólogo numa instituição. Recuso-me a ser apenas alguém que chega de fora e que “vem apagar o fogo”.
A valorização do psicólogo e clarificação do seu trabalho nos diferentes contextos, a dignificação do seu trabalho e a prestação de um serviço condigno são para mim questões que me assolam na prática profissional, das quais não abdico e que acredito que a Lista A – Psis pelos Psis também não! E é isto que me move!
Patrícia Oliveira
Candidata à Delegação Regional Centro