Artigo de Opinião, “Psicologia e a comparticipação dos sub-sistemas de saúde”, por Luís Gomes
Psicologia e a comparticipação dos sub-sistemas de saúde
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Se uma Rosa tivesse outro nome ainda assim teria o mesmo perfume- dizia Shakespeare A rosa é uma das mais populares flores do mundo. Parece remontar à antiguidade o seu cultivo. Existem dezenas de espécies e milhares de variedades. Ao longo do tempo sofreu por força de condições, caprichos ou desígnios circunstanciais vários cruzamentos e modificações. Mas continua ser Rosa. Existem amarelas, vermelhas brancas ou azuis. Podem ser arbustos ou trepadeiras. Mas continuam a ser Rosas. Parece ser o mesmo que se passa connosco. Psicólogos. Clínicos, Educacionais, Organizacionais, mas sempre Psicólogos.
Já voltaremos à jardinagem, atividade muito terapêutica. Para já reflito sobre um assunto muito ligado à clínica, mas que é transversal às outras áreas de intervenção. Que é a inexplicável confusão do papel do psicólogo na gestão do relacionamento do cliente com as instituições, sistemas e sub-sistemas de saúde, ou de intervenção social. Esta confusão deve ser familiar a muitos dos colegas que diariamente têm de se ver a justificar o seu trabalho a órgãos, instituições ou mesmo indivíduos que para além de não terem competências, não têm o direito legal de pedir essa justificação. Tentemos então contextualizar este assunto.
O que não nos cabe
Não cabe ao Psicólogo, nomeadamente clínico, intervenções ao nível administrativo no relacionamento entre o seu cliente e os sub-sistemas convencionados de saúde, que excedam o estritamente necessário. Contudo, são muitas vezes confrontados com a devolução de recibos legitimamente emitidos, sendo-lhes exigida a prescrição do médico, pedidos de fotocópia da cédula e até informações clínicas! A estes pedidos os colegas anuem, na medida em que em muitas situações os clientes se encontram impotentes para aceder à subvenção a que têm direito, influenciando isso, não raramente, os custos dos tratamentos ou intervenções. Afinal, o que tem um Psicólogo de fazer?
O que nos cabe e que a Ordem deveria fazer respeitar
a) O psicólogo goza de plena autonomia para praticar os atos próprios da profissão, nos termos da lei e da deontologia profissional.
b) Não existe nenhuma subordinação do ato Psicológico ao ato Médico. Existe sim aprovada por lei uma sinergia e complementaridade no exercício das duas profissões. Não carece assim o Psicólogo de nenhuma prescrição exterior às suas competências definidas por lei para que os seus atos sejam legítimos e no interesse da saúde do seu cliente, e como tal devem ser comparticipados.
c) A identificação do Psicólogo não carece que qualquer cópia da sua cédula profissional (o nome e número bastam) na medida em que o enquadramento jurídico/profissional da sua atuação é público através do diretório da OPP.
Todas estas condições estão definidas por lei, foram propostas e aprovadas pela Presidência do conselho de ministros no dia 15 de Setembro de 2016 e poderão ser consultadas em Diário da República. E também no Estatuto da Ordem dos Psicólogos Portugueses, aprovado pela Lei n.º 58/2008, de 4 de setembro, com as alterações que lhe foram introduzidas pela Lei nº 138/2015, de 7 de setembro.
É a OPP, que em nome e representação do Estado prossegue fins de regulação e fiscalização de interesse público, e que tutela o exercício da profissão de Psicólogo, quer este a exerça numa instituição ou de forma individual/privada.
É à OPP que cumpre defender os interesses versados nos pontos acima que regulam a profissão e balizam a ação do psicólogo e a sua autonomia técnica!
De volta ao Jardim
Existem muitas fragâncias e não soçobramos perante as dificuldades, não esmorecemos perante o facto das especialidades, que nos custaram muitas horas de trabalho e estudo, não serem reconhecidas em termos de carreira. Continuamos de facto a exalar um perfume que não agradando a todos, muito tem contribuído para a sobrevivência da saúde mental nacional. Nos lares, nas casas de acolhimento, nos hospitais, nas IPSS, nas linhas de atendimento, na Intervenção em catástrofe, nas forças de segurança…
Não é por não nos chamarem pelo nome, e não respeitarem a nossa identidade, que não nos damos ao respeito. Mas de facto uma Rosa para além do seu perfume merece o seu nome. Cabe a todo o psicólogo lutar pelo seu nome mas cabe à ordem defender o nome de todos os psicólogos.
Nós merecemos uma Ordem que seja dos Psicólogos, para os psicólogos e pelos psicólogos. E a Ordem merece que os psicólogos sejam por ela.
Luís Gomes, Candidato ao Conselho de Especialidade de Psicologia Clínica e da Saúde